No dia em que completam 27 anos de atuação, representantes do Instituto Steve Biko afirmam que o principal motivo de comemoração é ter inserido cerca de cinco mil jovens em universidades públicas e privadas. Sem fins lucrativos, a entidade foi criada em 31 de julho de 1992 e atua com a preparação de jovens para acessar o Ensino Superior, além de programas de intercâmbio e de iniciação científica.
“O principal motivo a se comemorar é a gente ter conseguido interferir na estrutura racista do país com o acesso de jovens negros e negras nas universidades. Vivemos numa sociedade racial, com moradias precárias, sem saneamento básico e escolas públicas precárias”, ressaltou a diretora pedagógica do instituto, Tarry Cristina Pereira, durante a celebração realizada nesta quarta-feira!(31), na Casa de Castro Alves, no Pelourinho.
Para ela, além do curso pré-vestibular, o Instituto contribui para que os jovens “compreendam seu protagonismo”. “Na medida em que eles conhecem autores negros, heróis negros, recuperam a autoestima e vão na contramão. O jovem sai da estatística policial. A jovem que não engravida”, acrescentou Tarry.
Diretora executiva da entidade, Jucy Silva destacou que os resultados são positivos. “A gente celebra esses resultados que são positivos com relação à missão do instituto, que é justamente a ascensão da comunidade negra através da educação”, ressaltou. Segundo Jucy, os jovens que participam da iniciativa se fortalecem para “combater o racismo e formar a própria identidade”. “Em cada 31 de julho, o sentimento é de resistência, de conseguirmos estar aqui apesar das dificuldades”.
Atualmente, 75 negros e negras cursam o pré-vestibular. Há, ainda, o programa Oguntec, com o objetivo de fomentar o interesse pela iniciação científica. O instituto recebe, também, estudantes de universidades de outros países que vêm para entender como se desenvolve o racismo no Brasil.
A estudante Acácia Reis, 19, foi incentivada pela a mãe e cursa a turma do pré-vestibular deste ano - Turma Edson Cardoso. Ela pretende ser aprovada no curso de Medicina. “Minha mãe queria achar um lugar onde eu pudesse me identificar. O curso é muito importante. Ajuda a desconstruir um universo do mundo lá fora de coisas que são impostas pra gente. Nele, a gente aprende sobre nossa história, nossa ancestralidade. Coisas que os livros da escola não contam”, destacou.
Apesar de atuar há quase três décadas, a entidade tem, como principal desafio, a dificuldade de angariar recursos para manter os custos das iniciativas. A diretora pedagógica contou que parcerias com organizações, sobretudo internacionais, é o que tem ajudado a manter o instituto.
Prestes a se formar em Serviço Social pela Universidade Católica do Salvador (Ucsal), a estudante Débora dos Santos, 31, participou do projeto em 2014. “Todo espaço que vou sempre falo que Biko é precursora da mudança de vida da minha geração. Eu não sabia o que era Universidade. Tive formação política e construí minha identidade racial. No instituto, identificamos quem éramos e quem era o sistema opressor que atuava contra a gente”, contou.
Debate - A celebração dos 27 anos da entidade contou com palestras da socióloga Vanda de Sá Barreto, da economista Ana Georgina Dias, da mestra em Desenvolvimento e Gestão Social Benilda Brito e do presidente de honra da Biko, Sílvio Humberto.
Para o vereador Sílvio Humberto, os 27 anos da Biko serviram para transformar vidas de diferentes gerações. “O instituto começou a atrair a juventude e isto foi passando de geração em geração. A Biko é esse espaço que se alimenta da boa energia das pessoas. Como me disse Lázaro Ramos uma vez: a Biko torna as pessoas possíveis”, pontuou.
“O racismo é um campo organizado. Não é uma coisinha qualquer. Ele produz o preconceito e a discriminação racial, além do racismo estrutural, no âmbito do próprio estado”, ressaltou a socióloga Vanda de Sá Barreto, que parabenizou a Biko por ajudar “a romper com o retrocesso”.
A economista Ana Georgina Dias contou que, quando se formou, era a única negra na turma de Economia da Universidade de Brasília (UnB). “A ascensão de uma pessoa negra é mais difícil que de uma branca. O racismo não é sutil. Basta se debruçar sobre qualquer indicador”, afirmou.
Na programação, houve, também, a participação da banda Muza e desfile Bikud@s na Moda, com seis empreendimentos negros que vêm se desenvolvendo hoje. no mercado Maria de Biquini, Xeidiarte, Preta Estampa, Bate Papo com Ibejis, Agudá Moda & Artes, Cantinho da Preta foram as iniciativas que desfilaram no local. Além de divulgar a capacidade criativa de empreendedores negros e negras, o Desfile teve a função de captar recursos para o desenvolvimento dos projetos do instituto cultural Steve Biko.
“Foi a partir da Biko que me tornei o que sou hoje”, ressaltou a estudante de Psicologia e produtora cultural Daniela Santos. Ela foi uma das empreendedoras que tiveram seus produtos expostos no desfile. “Criamos a linha de produtos Ibejis para poder manter nosso projeto com crianças em terreiros que temos há sete anos. Os produtos, bolsas e camisas, vendemos dentro do próprio projeto e em feiras”, finalizou.
Com a celebração desta quarta (31), o Instituto Steve Biko chega mais próximo de três décadas de formação educacional, racial, social e cultural de uma juventude que o país espera o mínimo, mas que na Biko a meta é sempre o máximo. E mais um pouco.