OGUNTEC: Juventude Negra construindo o futuro através da Ciência, Tecnologia e Inovação

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OGUNTEC: Juventude Negra construindo o futuro através da Ciência, Tecnologia e Inovação

OGUNTEC: Juventude Negra construindo o futuro através da Ciência, Tecnologia e Inovação


Há mais de duas décadas, o Instituto Cultural Steve Biko promove a inclusão de Jovens negros e negras nas carreiras de Ciência, Tecnologia e Inovação. Por meio do Programa Oguntec, realizado em parcerias com 10 escolas estaduais, beneficia mais de 100 estudantes em todo estado. E, nesta quarta-feira (24/04), o Oguntec deu início a mais uma edição com a realização da Aula Inaugural, no Centro Territorial de Educação Profissional Recôncavo II Alberto Torres, em Cruz das Almas, que teve 100% de aprovação dos estudantes participantes em vestibulares em 2023.

A cerimônia de abertura do ano letivo teve como aula tema “Ciência, Tecnologia e Inovação: caminhos da juventude”, foi ministrada pela mestra em história da África, da Diáspora e dos Povos indígenas e vice-diretora do Alberto Torres, Aldevane Araújo; pela engenheira agrônoma, doutora em Ciência e Tecnologia de Alimentos e professora do Instituto Federal Baiano (IFBAIANO), Rita Garcia; pelo mestre Estudos Interdisciplinares Sobre a Universidade (UFBA) e doutorando em Difusão do Conhecimento (UNEB) e professor da Faculdade Brasileira do Recôncavo (FBBR), Natanael Rocha; e o doutor em Letras (UFBA), professor do IFBAIANO e coordenador do NEABI-Ba, Ivo Ferreira.

 

De acordo com o diretor executivo do Steve Biko, Lázaro Cunha, o Oguntec é essencial, não apenas para a juventude, mas para toda a sociedade, pois é um mecanismo de tirar os jovens da mira da violência que está cada vez mais presente nas nossas comunidades.

“Infelizmente a violência está muito grande, os jovens estão com receio de sair de seus espaços para outros espaços e a gente não quer isso, se a gente se acovardar com isso aí, a gente vai tá deixando a violência dizer como a gente tem que viver. Hoje nós temos bikudos em 10 escolas e a gente quer fazer essa juventude se encontrar. É bom o pessoal de Cruz das almas ter um encontro com Camaçari, Lauro de Freitas, Ilha de Vera Cruz, Salvador, porque esses talentos precisam estar a serviço da melhoria da qualidade de vida desses espaços e eu acredito muito que, a partir de projetos como este aqui, a qualidade de vida comece a melhorar. Imagina um jovem desse aqui montar uma startup, uma empresa interessante e começar a gerar empregos e renda para a cidade, todos vão ganhar! E esse é o objetivo do Oguntec, que além de salvar vidas, constrói projetos de vida e qualifica estes potenciais que podem estar a serviço da sociedade. Nossas ações e projetos nunca são individuais, são sempre coletivos. Não é só a juventude negra que ganha com os projetos desenvolvidos pelo movimento negro, como a Biko, toda sociedade brasileira ganha com isso”, afirma Lázaro Cunha.

A vice-diretora, Aldevane Araújo, fala da importância da parceria entre o Oguntec e o Centro Educacional desde o início.  “Na edição passada a gente conseguiu o marco de aprovar 100% dos estudantes em universidades. E eu fico feliz em renovar essa parceria e que possamos ampliar cada vez mais o acesso dessa juventude no ensino superior. Estamos juntos nesta parceria, pois queremos cada dia mais que jovens melhorem sua qualidade de vida e das suas famílias”. E reforça a importância de pessoas como ela acessarem esses espaços e melhorarem suas vidas e de suas famílias. “Eu estudei aqui no CEAT e, agarrei a oportunidade, como uma mulher que veio de comunidades rurais, e hoje sou professora e vice-diretora. Ascendi, através do acesso à educação, tendo consciência social mais crítica, acreditando na educação como um caminho sólido e que abre diversas portas”.

 

     

 

O professor Natanael Rocha, trouxe a noção da esperança de um mundo melhor através dos acessos de negros e negras a educação. E falou também do grande desafio da permanência na escola. “Quando eu pensei em trazer a relação entre a educação básica e a universidade, eu fiquei pensando no desafio que temos de permanecer na escola, permanência na escola de jovens negros. E eu falo, pois eu trabalho desde os sete anos de idade, eu venho das classes populares onde lá em casa eu sou o primeiro da minha família materna a ter uma trajetória mais longa na educação. Eu sou o primeiro que insistiu na Educação. E olha que interessante, por mais que tivesse desafios lá em casa, minha avó completa hoje 91 anos, ela insistia na educação, mas, ao mesmo tempo, a gente sabia que não era possível somente estudar, então, desde cedo eu precisei aprender um ofício. Então passei a entender a educação como um processo de mobilidade social, eu queria mais condição financeira para melhorar a minha condição e a da minha família”.

Ainda de acordo com o professor, a universidade possibilita a descoberta do mundo real: “Eu descobrir na universidade que é possível sim ter uma mobilidade, não como imaginamos, pois a gente continua na labuta, continua trabalhando, não cai do céu, mas a gente continua insistindo pra ter uma condição melhor e possibilitar aos mais velhos viverem melhor e auxiliar os mais jovens, mas, mais do que isso, depois que acessei a universidade, passei a ampliar meu desenvolvimento crítico sobre minha condição social e racial na sociedade. Então o que estamos fazendo aqui na virada do século XX para o XXI é ampliar a possibilidade para que nós, estudantes negros/as, das classes mais vulneráveis possamos estar em outras condições, para que tenhamos condição de estar efetivamente abrindo outras portas, outras possibilidades e o Oguntec está fazendo este acerto de contas, de evitar que os talentos sejam perdidos pela sua condição social e racial. É preciso pensar as estratégias para que os jovens tenham as condições necessárias para alcançar a universidade, pois a gente não quer estar apenas nos cursos populares, mas também ter a possibilidade de alcançar outras áreas, ditas elitizadas como medicina e engenharias e é essa a missão do Oguntec”, finaliza Natanael.

 

O doutor em Letras, Ivo Ferreira reforça a importância da referência dos que vieram antes, na abertura de caminho para acesso à educação superior, olhando para sua própria trajetória. “Eu me tornei doutor aos 40 anos, a minha sobrinha está se tornando doutora em biomedicina aos 25. Isso é interessante e é o caminho que queremos para cada jovem. Cada um de nós é a ponta de lança que vai abrindo caminho para quem vem atrás”. Ferreira também reforça: “Nós somos os primeiros a entrar em uma universidade de nossas famílias, mas nós somos descendentes de culturas milenares que têm soluções que a universidade nem pensa, pois a universidade brasileira ainda é eurocêntrica, então, ela não é o universo, e vocês [jovens negros e negas], entrando na universidade vão dar a capacidade de universo e diversidade dessa tecnologia e, principalmente, comecem a pensar em Tecnologia de África, onde nos faz pensar que em determinadas coisas que hoje pensamos ser uma grande inovação, os nossos antepassados africanos já pensaram a mil anos antes”, finaliza.

De maneira emocionada, a pesquisadora Rita Garcia, filha de comerciantes, tratou da importância de falar para jovens e da construção de um futuro melhor para todos, pois ela já esteve neste lugar. “Eu já estudei aqui na época que era CEAT, fiz técnico agrícola, quando eu estudei aqui não tinha esta estrutura e, muitas vezes, eu precisei me sentar no chão, às vezes a gente trazia um pedacinho de papelão, pra sentar e não sujar a roupa e pra utilizar como abano, pois não tinha ar condicionado, nem ventilador e faltava muitos professores. E hoje, comparando a minha época, a gente tem muitas oportunidades e, ao mesmo tempo, me dá uma certa tristeza, quando eu vejo que o colega Natanael falar que foi o primeiro da família ainda nos dias de hoje, pois eu fui a primeira doutora da minha família, mas eu nasci na década de 1960, e muita gente hoje, depois do Brasil ter uma universidade há mais de cem anos, ainda tá sendo o primeiro. E o que podemos fazer com essa informação: se eu, o Ivo, o Natanael têm sido os primeiros, significa que a gente não precisa de referência para ser. Então não tem ninguém na família, vai passar a ter. O pioneirismo é nosso. Temos que ficar atentos/as às oportunidades que a gente tem. Hoje a gente tem o CETEP melhorado, tem o Oguntec, tem as redes sociais que nos dá acesso a muitas aulas de qualidade, a podcasts, a gente não pode deixar isso parado, logicamente que a gente vai precisar de estratégias para isso, trocar as horinhas da dancinha do TikTok pra ver umas aulas, a gente vai precisar escolher esse caminho pra atingir e ter um horizonte, saber que lugar eu quero chegar e esse horizonte perpassa pelo trabalho, por uma função social”. 

A grande questão desta aula foi posta no sentido de que a juventude negra baiana desafie-se e construa, coletivamente, um futuro com outras possibilidades a partir das oportunidades e da educação. Então, onde você se vê daqui a cinco anos?




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